quinta-feira, 28 de abril de 2011

Desconexo - poema (?)

Esta é uma foto de uma colagem feita numa parte de uma parede da minha casa. Antes de ser reformada a parede e esta "instalação" ser extinta para sempre, tirei uma foto, olhando bem (ou só olhando mesmo) dá para perceber como a parte colorida já está desbotada.
***


DESCONEXO

Dizem que sou desconexo
dizem que sou incerto
só porque não uso o meio
nem o fim
me entendem ao reverso
só por não jogar esse jogo

me diga quando a terra começa
depois me diga sobre seu fim
tudo inventado
não gosto do todo
só de partes
só gosto de um pouco
mas não do começo, do meio e do fim

essa ideia do nexo
me deixa perdido
essa coisa do certo
me deixa ofendido

porque amar só de um jeito
porque um jeito
é jeito de amar?
meu coração não bate sempre igual
então porque é assim que devo escrever

troco a lógica por um coração
troco o nexo por um pensamento
que não sei onde começa
que não sei onde termina
troco o sentido pela paixão

dispenso seu jeito
pois o meu é mais bom
renego a gramática
ao falar da língua

não quero esse nexo
nem coca-cola
não adianta, não dá
como suportas
esta unica forma de pensar?
26/04/2011 - 23:46

terça-feira, 19 de abril de 2011

Complicações e Explanações

Aqui um pouquinho de Mondrian. E um texto que não pretende chegar a muitos lugares
***

Complicações e explanações

“Moço, acorda moço”, dizia uma mulher enquanto o chacoalhava. Havia cochilado, estava com sono por isso entrara numa sala vazia da universidade, fez uma cama com as cadeiras e começou a ler “O discurso filosófico da modernidade” de Jürgen Habermas. Se tinha lido duas páginas era muito, pois logo dormira. Se levanta, sem dizer palavra alguma, “ei, não pode dormir na sala não”, dizia ela enquanto varia o lugar. Olhou para ela, pegou seu livro, olhou as horas e saiu, tinha um compromisso e seu celular já iria despertar. Antes de mais nada, entrar naquela sala de propósito, queria dormir mesmo. Tinha trabalho a fazer, apesar de desempregado.

Ele e um amigo seu queriam desenvolver um método mais filosófico para o português, provando que não é a língua necessariamente que condiciona uma filosofia:

- Você já viu que usamos o verbo Ser para afirmar algo?

- Como assim, não lhe compreendo... – respondeu seu amigo.

- Veja só, se eu te perguntar se algo pode ser assim, de tal forma e você concordar não há uma chance enorme de você dizer “é”.

- Claro, o “é” significa o verbo Ser. Mas qual a relevância disso tudo?

- Bem podemos pegar um exemplo, no alemão se diria: Das leben macht schwer, enquanto no português do Brasil dizemos que: a vida é difícil. Em uma língua temos a vida como se fazendo difícil e noutro temos a vida como algo difícil, a diferença entre algo se fazer e outro algo Ser, traz suas implicações.

Eles logo mudaram de assunto, pois seu domínio lingüístico era fraco demais para uma divagação mais profunda. Como bons universitários, assistiram suas aulas. Ao término delas ele foi para a casa de sua namorada, ela lhe esperava. A cabeça dele estava naquilo que podemos chamar de conturbada, quando não estava lendo estava pensando, estava escrevendo, estava aprendendo alemão por conta própria. Ele e sua namorada se davam bem, conseguiam conversar bastante:

- Sabes de uma coisa que eu fico pensando meu amor? – falava ele para ela enquanto estavam sentados na sacada do apartamento tomando um pouco de chimarrão e esperando começar algum filme no canal educativo. – Quantas pessoas estudam o alemão pelos mesmos motivos que eu?

- Como assim, por causa da questão da língua?

- Também, mas se não fossem personalidades como Benjamin, Nietzsche, Marx, Freud e em especial Heidegger, não sei se eu estudaria o alemão. Poderia estudar russo, pois adoro Dostoievski.

- Kafka também era de língua alemã, apesar de tcheco. Eu gosto do Kafka. Sabias que lembrei de ti quando li carta ao pai?

- é mesmo, porque?

- Não sei porque, mas lembrei de você. Creio que todos tem uma relação esquisita com seus pais, mas você tem uma mais que a minha, talvez por isso a carta do Kafka me lembre mais você.

- Sabes onde eu mais me encontro atualmente? – Perguntava ele enquanto enchia a cuia com água quente.

- Onde? Em Kafka ou no Fíodor? – Chamavam Dostoievski pelo primeiro nome na intimidade deles, pois achavam Fíodor um nome legal.

- Na literatura japonesa.

- Sim, mas quantos livros japoneses você já leu? – perguntou ela que era mais esperta e tinha um pensamento mais aguçado que ele.

- Eu sei, foram poucos, dois do Kawabata e um de Mishima. É pouco, mas por isso eu gosto menos, ou por isso me identifico menos?

- é, não gosto de gente, em geral fãs de banda que se você não tem a discografia completa, você não gosta da banda.

- Agora, eu acredito que boa parte dos meus colegas estudam o alemão por alguma admiração ao NSDAP ou por que engolem esse turismo daqui.

- Falando nisto, fiquei sabendo que agora os latões de lixo serão em estilo típico. E tem uma escola municipal que está sendo pintada em estilo típico também.

- Será que eles sabem que tem coisas na Alemanha que não seja chope ou nazistas? Por isso gosto tanto de falar do Baader-meinhof, choca as pessoas saberem que na Alemanha existiu um grupo terrorista marxista-leninista.

- falando nisso esses dias alguém explodiu um caixa eletrônico e conseguiu roubar o dinheiro.

Como ele estava precisando de dinheiro, achou a idéia interessante, mas algo o impedia de fazer isso, e não estou falando apenas de vontade ou moral. Ficou quieto enquanto chupava a água quente, pensativo, olhando para o céu escuro onde não podiam ver as estrelas por causa das luzes da cidade e para sua namorada, que tanto amava:

- Quando vamos embora? – ela perguntou, pois sempre falavam nisto.

- Eu queria ir agora, mas fico num impasse enorme, pois estou no último ano da minha faculdade, é melhor largar tudo com um diploma na mão. Infelizmente vou me curvar a isto, por mais que eu discorde e tenha inúmeras opiniões.

- Deveríamos ter ido antes de você estar tão longe na sua faculdade, assim nos prendíamos menos, assim seriamos menos parados.

O filme iria começar, era um filme iraniano, que atualmente estavam na moda. Após assistirem o filme ele pensou em ir para algum país árabe. Ela não queria, pois a língua era difícil e não se sentia atraída pelo deserto. Nisto eles discordavam, por isto se davam tão bem.