quarta-feira, 20 de julho de 2011

Mesmo depois de tanto tempo

Isto é Escher, não entendo nada de arte visual, mas adoro seus desenhos.

*

Mesmo depois de tanto tempo

Simplesmente não dá para entender, como depois de tanto tempo juntos, ele ainda sentir tudo aquilo por ela. Por vezes, ver ela no dia seguinte era como vê-la pela primeira vez. E agora era uma destas vezes. Ele a abraçou, sentiu o corpo quente dela tocando o seu corpo frio. Se beijaram, o gosto de pasta de dente vinha da boca dos dois, que mesmo depois de tanto tempo ainda se importavam com estes detalhes. É verdade que era apenas no primeiro dia, depois tomavam banho para ficarem mais juntos pouco ligando para a dita higiene.

Ela tinha um corpo bom, muito bonita, rosto bonito, delicado, era esperta, mais do que ele até, por isso conseguiam conversar bastante, isso era uma das melhores coisas entre eles. Algumas vezes, lembrava dos primeiros amores que fizeram, do frio na barriga, que é um frio gostoso, da mão dela pegando com força, da carne esmagada por entre os dedos, o bico do peito na ponta dos seus lábios. Mesmo depois de tanto tempo, dava para sentir aquela sensação estranha, mas muito prazerosa.

Se conheceram como tinha que ser, pelo acaso, não há explicação, pois talvez depois nunca mais iriam se encontrar, talvez ainda se encontrariam muito, e não ocorresse nada demais. Ele nem sabe como fora acontecer, ela diz o mesmo quando conversam sobre isso. O acaso não fez tudo pelo amor, talvez o uso simples de uma palavra como “clichê” e entendida por ela e seus amigos conectou o que eles mais precisavam, aquilo que não sabemos o que é e alguns falam de espírito ou signo, outros de intelecto, mas nada disso chega nem perto ou explica. Mas não aquele intelecto racional, que aprendemos numa escola, mas aquele intelecto que é o pensar e gostar dos dois. Coisas in-comuns, uma troca constante de amores e gostos (da boca, do filme, da perna, do seio, dos livros, da música, dos dias, do pé, da bunda, dos pássaros, dos copos, da comida, do sexo).

É assim que mesmo depois de tanto tempo, o coração ainda consegue bater, tão bem quanto sempre. O estomago ainda responde por eles, a cabeça ainda sonha com ela. Vontade de fazer na praia, no chão, na banheira. Comer uma massa regada ao vinho, sentir remorso, mas bem pouco, por ter feito algo tão burguês como comprar um vinho que vem numa garrafa fechada com rolha – e não falo de um garrafão. Isso tão pouco lhes cortou aquele vinculo com o passado das bebidas baratas, da cachaça, da vodca e do garrafão, da praça, do tesão, do rock, da festa, dos amigos, do dinheiro (que sim, ainda era pouco, porém um é muito mais do que nada).

Ele gostava tanto dela, que fazia coisas que já não gostava tanto, exceto por ela. Coisas como versinhos, como o amor daquele romantismo alemão, que põem a mulher numa posição machista. Mas é o que a sua cultura lhe marcou, a de pensar de certas formas. Mas conseguem construir seu romantismo a sua maneira, se trocam e completam.

Enfim nada lhes impedia de sentir tudo aquilo que se sente no começo, mesmo depois de tanto tempo.